Friday, October 30, 2009

Alan Turing again

"from: aturing@mail.above.net.aa
to alexandre.lucas@rh.underworld.net.zz
date Sat, Oct 31, 2009 at 12:10 AM
subject Internet and Human Rights
mailed-by mail.above.net.aa
signed-by above.net.aa

Prezado Senhor Alexandre Lucas,

Quem lhe escreve é o antecessor em interesse pela informática Alan Turing. Recentemente saí de longa depressão desde meu suicídio com uma maçã por mim envenenada com cianureto em 1954. A história você já conhece e amigos aqui de cima disseram-me que inclusive repercutiu recentemente após o pedido de desculpas do Governo Inglês, na figura do Primeiro Ministro Gordon Brown. Confesso que esse tardio reconhecimento foi o que me tirou da depressão e auto-comiseração.

Na última semana até criei coragem e li seus posts técnicos sobre softwares e hardwares. Agradou-me o interesse mútuo, mas não é isso que me traz a estas linhas, e sim a falsa sensação de segurança e aceitação social que venho observando na comunidade GLBT.

Verdade que na maioria do mundo civilizado os tempos não são mais tão difíceis e de absurda crueldade e desumanidade como em 1954, quando deram a mim, um herói da 2a Grande Guerra, duas "opções" por ser homossexual: cadeia ou castração química. Os efeitos nefastos sobre meu corpo da 2a me levaram a considerar e levar a cabo o suicídio. Fui perdoado e por isto escrevo daqui de cima.

Tive tempo de estudar e observar o desenrolar dos tempos nestes anos todos de relativa reclusão aqui no além-morte. Posso dizer e peço que observem que a relativa aceitação, retirada do código internacional de doenças (ainda não atingido pelas comunidades trans e intersexo), redução dos direitos fundamentais negados e repressão das várias formas de preconceito e estresses familiar e profissional.

Peço atenção: não baixem a guarda. A sensação de segurança é ilusória. Para tomar como exemplo o Brasil, só ocorre em menos de meia dúzia de grandes centros urbanos, e restrita a "guetos" - palavra adequada embora com aspectos pejorativos - e é descaradamente negada às classes baixas e na maioria do país grassa o preconceito aberto, com apoio da maioria da população. Poucos corajosos vão abrindo caminho, como eu - no meu caso involuntariamente - sob grande custo pessoal.

Sabemos que seu Chefe, como o Meu, são simpatizantes. Ambos acima desses humanos atrasos mentais. Isso é que me leva a confiar que um dia a igualdade de direitos será atingida. Peço que me informe, agora que descobri a militância, em que posso ajudar.

Atenciosamente,
Alan Turing

(tradução gentil do inglês britânico para o português contemporâneo pelos anjos (agora caídos) que estiveram a instigar o povo da extinta Babel bíblica).

Minha resposta foi sucinta:
Caro Alan,

Inicialmente peço que perdoe chamá-lo pelo 1° nome, mas achei Mr. Turing por demais sisudo. Apenas lhe digo: fique tranqüilo. Veremos, não nego, retrocessos, mas a Roda da Vida gira sempre adiante, ao final. Consultei nosso jurista, Conselheiro Pavi, e ele compartilha esta opinião, também pela posição dos Poderosos, embora o Papa Palpatine pregue o contrário.

Humberto Eco já dizia que somos anões no ombro de gigantes. Tenha o orgulho de que não viveu nem sofreu em vão. Sua mensagem ficará para sempre aqui registrada.

Conselho pessoal: peça autorização ao controle de trânsito e compareça a algumas de nossas festas. Traga Harvey Milk com você. Sentirão que nada como a troca de felicidades.

Um abraço,

Alexandre Lucas.

P.S.: a Tábata já está agendando esteticista e médicos para reverterem suas seqüelas. O pessoal aí de cima é muito conservador e valoriza chagas. Águas passadas não movem moinhos.