Tuesday, December 8, 2009

Small I am...

...but strong, in The Force.

Hoje recebi a ligação de um amigo questionando meus valores, meus sonhos, minhas atitudes e minha vida. Apenas pude responder que nada é certo, e que a gente teima em seguir em frente.

Em um tempo que não pode ser medido e num lugar muito, mas muito distante, que não existe mais, exceto em minha memória, houve uma casa em que eu morava com um amigo. Praticamente um irmão. E ele me entendia com uma simples olhadela e eu correspondia. Porque sabíamos já que a realidade não passava de uma ilusão, o "mundo" de uma escola e que se levar a sério demais deixa a gente doente.

Sinto pena dos que não percebem que este blogue mescla realidade e ficção de um modo tão simples que não é difícil separá-las, ao menos sob as convenções tradicionais.

Mas meu amigo mandou-me uma carta, dessas de papel e tinta, escrita em uma língua que ninguém mais fala, exceto nós. Ele disse que está muito triste e viria me ajudar, se a viagem não fosse tão longa, difícil e custosa. Ele está triste por mim e pelo tempo excessivo que tenho me demorado em alguns aprendizados, ou mesmo releituras de coisas que ambos já sabemos. Mas numa frase ele me confortou:
...amigo, confio em ti, e nisso tenho meu consolo. Te espero daqui na melhor das torcidas.

Coitados daqueles que não têm amigos, não trocam cartas ou confidências. Porque de mais nada é feito o tênue tecido da vida.


P.S.: o "keymaker" está a caminho.

Wednesday, December 2, 2009

A Sorte de Catarina

Há muito tempo atrás, viveu um mercador muito rico e generoso, que possuía um palácio deslumbrante. O orgulho de sua vida era sua filha, uma linda criatura chamada Catarina. Catarina era alta e magra, com cabelos negros e olhos grandes e brilhantes. Suas mãos e seus pés eram pequenos e delicados, sua pele tão macia como as pétalas de uma rosa.

No palácio havia tronos de ouro, turquesas enfeitavam cadeiras de prata, rubis as molduras dos quadros e diamantes as fontes de água. Tudo ao redor de Catarina era luxo e beleza. Pavões passeavam pelos jardins, flores desabrochavam em vasos pendurados nas árvores, em suma, o melhor que o dinheiro podia comprar.

Um dia, quando Catarina estava andando pelo jardim, vestida numa longa túnica de seda bordada em finíssimas pérolas, com um capuz do qual pendiam outras tantas fileiras de pérolas, uma dama de aparência elegante surgiu à sua frente. Havia algo de notável nessa mulher, seus olhos eram muito penetrantes e escuros, suas roupas pareciam não ser nada além de cortinas luminosas.

- Catarina, minha querida criança, disse a dama, o que você prefere: gostaria de gozar sua vida na sua juventude ou gostaria de gozá-la na sua velhice ? Você tem somente essas duas escolhas.

Catarina pensou por um momento e então falou:

- Se eu tiver o meu prazer agora, sofrerei por isto nos meus últimos anos?

E a dama alta respondeu: Sim.

- Mas como é que você sabe ? perguntou Catarina, que continuava a ponderar sobre a questão.

- Porque eu sou a sua Sorte, respondeu a aparição.

- Oh, então eu terei a minha boa fortuna na minha velhice, disse Catarina.

- Muito bem, que assim seja, disse a sua Sorte, e desapareceu.

Catarina nada pensou a respeito desse encontro e retornou até sua casa para trocar suas roupas por outras ainda mais finas. Mas alguns dias depois algumas coisas terríveis começaram a acontecer.

Uma grande tempestade se abateu sobre o mar. O pai de Catarina estava esperando seus navios voltarem de um país estrangeiro, carregados de ricas mercadorias, mas todos eles foram mandados para o fundo do oceano pela tormenta.

Seus armazéns foram queimados por um misterioso fogo; então, quando ele decidiu preparar novos navios, nada havia para colocar dentro deles. Ele alugou seus barcos a um duque, que queria acompanhar um príncipe que seguia para a guerra, mas todas as naus foram afundadas num encontro com piratas. Os homens do duque foram mortos e o próprio duque ficou sem um tostão.

Ladrões arrombaram a casa e roubaram todas as jóias de Catarina; suas roupas foram então vendidas para que eles tivessem o que comer por mais algum tempo. Por fim, infeliz e doente, o pai de Catarina morreu, deixando-a só no mundo. Sem dinheiro e com roupas muito simples, Catarina decidiu abandonar essa cidade que havia lhe trazido tanta má sorte e encontrar, se possível, algum trabalho num outro lugar. Então ela disse adeus à cidade onde nascera e começou sua longa e penosa marcha.

Finalmente alcançou uma aristocrática cidade longe de seu próprio país, e parou um instante no meio da rua, imaginando aonde ir. Tinha um pouco de dinheiro, que uma antiga ama havia lhe dado, e estava pensando aonde poderia comprar um pouco de pão.

Uma senhora de boa posição, olhando para fora de sua janela, viu-a e chamou-a:

- Quem é você, minha querida, e de onde vêm? Você não é dessa parte do mundo.

- Senhora, estou sozinha no mundo, pois meu pai, que uma dia foi um rico mercador, morreu. Procuro um lugar onde possa comprar um pouco de pão.

- Venha para minha casa, eu preciso de uma criada e você desempenhará essa função muito bem, disse a nobre senhora; e Catarina entrou agradecida na enorme construção.

A senhora afeiçoou-se muito a ela, e lhe confiava todos os seus bens. Um dia a dona da casa lhe disse:

- Preciso sair por um momento; feche bem a porta e não deixe ninguém entrar ou sair até que eu volte.

Então Catarina fechou a porta e sentou-se perto do fogo. Mas a nobre senhora havia saído, a porta se abriu e sua Sorte entrou.

- Olhe, aí está você, Catarina ! gritou sua Sorte asperamente. - Arranjou um bom lugar para ficar, não é mesmo ? Bem, você não pode escapar de mim dessa maneira, sabe... E começou a atirar no chão todos os objetos de valor das dona da casa, quebrando vidros e porcelanas, rasgando em pedaços linhos caríssimos.

- Oh, não, não, não!!! gritou Catarina. - Isso vai me causar problemas terríveis! A senhora confia em mim!!

- Ela confia ? zombou sua sorte. - Bem, então explique isso quando ela voltar... e transformou a longas cortinas de seda em farrapos.

Catarina colocou as mãos no rosto e fugiu, correndo da casa, sem nunca olhar para trás, no caso de sua sorte estar lhe seguindo. Mal ela acabara de sair, sua Sorte colocou tudo novamente como estava antes e desapareceu.

Quando a senhora retornou, a casa estava perfeitamente arrumada, mas Catarina tinha ido embora. A senhora chamou e chamou, mas claro que a pobre garota não ouviu, pois estava já muito longe.

A dama examinou tudo, pensando que talvez Catarina a tivesse roubado, mas nada estava lhe faltando. Ela não podia entender o que acontecera, pois a garota parecia ser de toda confiança.

Ora, a pobre Catarina correu até alcançar outra cidade e, ao procurar um lugar onde pudesse comprar um pouco de pão, outra senhora que estava parada na janela a notou. A dama abriu a janela e lhe falou:

- De onde você é e o que faz neste lugar, já que é obvio que está perdida?

- Sou uma pobre garota de longe e procuro algo para comer, pois tenho muita fome, respondeu Catarina.

- Bem, venha para minha casa, disse a dama. - Eu vou alimentá-la, vesti-la, e arranjar-lhe um lugar entre a minha criadagem. Então, Catarina entrou. Mas a mesma coisa aconteceu, como antes.

Assim que ela se estabeleceu na casa e todos os valores lhe foram confiados, sua Sorte apareceu e criou o caos em apenas alguns segundos.

- Você pensa que há algum lugar nesse mundo onde eu não seja capaz de encontrá-la ? gritou sua sorte asperamente, derrubando frascos de incenso de valor incalculável que se espatifaram no chão. Catarina colocou as mãos no rosto e correu.

E assim foi durante sete anos. Cada vez que Catarina era acolhida por alguma simpática senhora, o aparecimento de sua Sorte fazia com que ela tivesse que partir em viagem, infinitamente, parecia-lhe. Mas ela nunca conseguia escapar por muito tempo. Porém, - e isto Catarina não sabia – sua Sorte sempre restaurava tudo à antiga forma, no mesmo minuto em que Catarina desaparecia.

Bem, sete anos se passaram e quando Catarina estava trabalhando para uma senhora nobre, muito bondosa de coração, parecia que sua Sorte quase havia se esquecido dela. Dia após dia Catarina cuidava da casa, e tudo dava certo para ela. No entanto, a tensão era muito grande, pois a cada hora ela esperava que a porta se abrisse e sua Sorte aparecesse.

Todo dia ela devia ir à montanha para sua patroa, com uma cesta repleta dos mais finos pães e queijos. Uma figura alta e digna pegava a cesta de suas mãos graciosamente a cada dia e, após cumprimentá-la, desaparecia na caverna.

Um dia sua senhora patroa lhe disse:

- Sempre procuro ganhar as boas graças de minha Sorte dessa maneira. Se eu não lhe enviar pão fresco e queijo, tremo só em pensar o que ela poderia causar-me.

Nesse momento, Catarina começou a chorar, incapaz de esconder sua dor, pois ela havia sofrido muito nesses últimos sete anos, e não conseguia continuar escondendo sua tristeza.

- Minha querida criança, o que está acontecendo com você ? Conte-me logo! gritou a nobre senhora, colocando sua mão no ombro de Catarina.

Então Catarina contou-lhe a história da crueldade de sua sorte, e completou:

- Penso que não posso continuar nessa angústia, esperando que ela apareça a qualquer momento e transforme tudo em pedaços, como já fez tantas vezes. Na verdade, quero ir embora daqui logo, pois dessa forma não trarei a destruição de minha sorte para esta casa.

- Agora, deixe-me pensar num plano, disse a nobre mulher, balançando a cabeça. - Sim, já sei ! Quando você for à montanha levar o pão para minha Sorte, conte-lhe sua história e apele para que ela tenha uma palavrinha com a sua Sorte, para que deixe de atormentá-la dessa maneira. Tenho certeza de que minha Sorte, que é bondosa, ajudará.

Assim, no dia seguinte, quando Catarina foi até a montanha levar a cesta para a Sorte de sua senhora, pediu para que ela intercedesse junto à sua própria Sorte.

- Bem, sua Sorte está dormindo debaixo de sete cobertores nesse momento, disse a sorte de sua patroa. Mas quando você vier amanhã, eu a levarei junto comigo até ela, pois deve estar acordada.

Catarina foi embora cheia de esperanças e dormiu esta noite quase que completamente em paz. Ao levar o pão à montanha na manha seguinte, a Sorte de sua senhora levou-a até a sua própria Sorte, que estava deitada numa grande cama, enfiada até os olhos debaixo de sete cobertores de pena.

- Bem, irmã, aqui está Catarina, disse a Sorte de sua nobre senhora. - Pare de atormentá-la desse jeito, deixe-a um pouco em paz agora, eu lhe peço.

Sua sorte disse apenas:

- Aqui está uma meada de seda, ela lhe será muito útil, cuide dela com carinho. Agora deixe-me descansar. E desapareceu debaixo dos cobertores.

Intrigada com isso, Catarina voltou para casa. Sua patroa estava ansiosa para saber o que acontecera, mas a história que Catarina lhe contou não parecia ter nem pé nem cabeça.

- Essa seda não vale muita coisa, mas é melhor você guardá-la. Ela lhe deve ser útil, como sua Sorte disse, falou a nobre mulher.

O rei daquele país, que era jovem e extremamente bonito, estava para se casar. O alfaiate real estava muito constrangido, pois descobriu que, em todo o reino, não se encontrava seda da cor apropriada em quantidade suficiente para costurar o traje de núpcias do rei.

- Lancem uma proclamação, disse o Rei. Preciso que minha roupa fique pronta a tempo. Enviem-na aos quatro países que fazem fronteira com meu reino e aos quatro cantos dos meus domínios! Qualquer pessoa que tiver seda dessa cor deve trazê-la até a corte e eu a recompensarei generosamente.

A nobre senhora ouviu a proclamação e veio contar para Catarina:

- Catarina, minha criança, coloque coloque este vestido e leve esta meada de seda até a corte. É exatamente a cor que o alfaiate está procurando, ela gritou excitada. - Tenho certeza que você será generosamente recompensada.

Quando Catarina apareceu na corte e se postou diante do trono, o jovem rei achou-a tão bela que não conseguiu desgrudar os seus olhos daquele rosto.

- Sua majestade, disse Catarina, será que esta seda é adequada para seu traje de núpcias?

- Você será paga com puro ouro por ela, disse o Rei. Tragam a balança e pesaremos essa meada. Seja qual for o seu peso, você receberá o mais fino ouro do meu reino por ela.

Trouxeram a balança, mas não importava quanto ouro fosse colocado, a meada sempre continuava pesando mais. O rei mandou trazer mais balanças, maiores que primeira, e despejou todo seu tesouro nelas, mas a meada de seda continuava pesando mais.

Então, no auge da exasperação, e rei tirou a coroa de sua cabeça e colocou-a na balança. No mesmo instante a balança se equilibrou e o rei sorriu.

- Onde você conseguiu essa seda, minha querida ? ele perguntou a Catarina.

- De minha Patroa, disse Catarina.

- Impossível ! gritou o rei. Que tipo de mulher é sua patroa para possuir uma seda mágica como essa ?

Então Catarina contou ao rei tudo o que havia lhe acontecido, e ele tomou-lhe as mãos entre as suas:

- Vou me casar com você em vez de com a jovem à qual eu havia sido prometido. Ele disse e assim aconteceu.

Daí em diante, Catarina, que tinha sofrido tanto em sua juventude, viveu até se tornar uma senhora bem velhinha, e foi feliz até o momento de sua morte como rainha desse longínquo país.

Friday, November 20, 2009

Certa Vez

Há muito tempo atrás, "mais longe que os mais altos pássaros da memória alcançam", em que fui a trabalho - na época ainda não era do RH - numa cidade à beira de escarpas rochosas impiedosamente açoitadas pelo mar. As escarpas eram altas, e também as distâncias enormes, mas mesmo assim já havia terminado o trabalho e tinha dois dias livres. Até porque depois de um tempo convivendo com humanos sem consciência das ilusões da realidade, somos contaminados com algumas de suas manias. Resolvi folgar.

Um pouco afastado das rochas, cerca de uns 3.000m, havia um campo de lavandas que perdia-se da vista no horizonte. No meio das flores azuis vi pela primeira vez um dos meus maiores amigos, mestres, e que até hoje manda-me mensagens nas horas mais necessárias - sim, pois no RH só tem gente de olho no seu cargo, ou não seria do Inferno.

Disse Clarice Lispector - se não me engano - que amigos não se fazem, se reconhecem. E nos reconhecemos. Ele me chamou de longe com um aceno, suas roupas alvas contrastando com o campo azul. Disse-me que, sem medo de pretensão ou de parecer louco, tinha achado alguém a quem quisesse ensinar coisas que aprendeu em sua longa travessia.

Ensinou-me as coisas mais importantes da minha vida - com poucos concorrentes. Mas foi curso breve, relâmpago. A cada semana nos reuníamos no campo de lavandas e eu ouvia ele falar.

Certo dia, ele me disse que já tinha passado o que considerava o necessário para mim, e que, sem que perdêssemos contato, estes se espaçariam e seriam sempre breves e em momentos de crises pessoais. Explicou-me que era de um lugar muito distante, e que a viagem era muito demorada e custosa.

Neste ano, após 16 anos da última comunicação, quebrou o silêncio e mandou-me três avisos e um presente.

Só compreendi ainda o primeiro aviso, para o qual já providenciei preparativos. Mas tenho a certeza de que até o fim do ano entendo tudo - às vezes sou um tanto lento, não vendo o que se põe à frente do meu nariz.

Depois de M. (citado em outro conto), este foi o melhor reencontro de anos, em um ano particularmente difícil.

Wednesday, November 4, 2009

Prólogo

“Oh, Cidade de Tróia! A grande Tróia está em chamas!” Rossetti
“Antes do nascimento de Páris, Hécuba, rainha de Tróia, sonhou que tinha dado à luz
um facho que destruiria pelo fogo as muralhas de Tróia.”

PRÓLOGO
A chuva caíra o dia inteiro; ora densa, ora em finos aguaceiros, mas nunca cessando
por completo. As mulheres levaram os seus fusos para dentro, para junto da lareira, e as
crianças amontoaram-se sob as sacadas do pátio. Aventuravam-se a sair por breves minutos
entre dois aguaceiros para chapinhar nas poças rodeadas por fiadas de tijolo e patinhar de
lama o caminho até a lareira. Ao fim da tarde, a mais velha das mulheres que se encontravam
junto ao fogo julgava enlouquecer com o som dos gritos e do chafurdar, das cargas dos
pequenos exércitos, do embate das espadas de pau nos escudos de madeira, com o som dos
estilhaços e das brigas causadas pelos brinquedos quebrados, as lealdades deslocadas de chefe
para chefe, os gritos de “morto” e “ferido” quando alguém era excluído da brincadeira.
A chuva que caía pela chaminé era ainda demasiada para permitir cozinhar em
condições na lareira; com o escurecer do dia de inverno ia se acendendo o lume nos braseiros.
À medida que o cheiro bom da carne e do pão a cozer se ia espalhando, as crianças vinham
uma após outra acocorar-se como cachorros famintos, inspirando ruidosamente e discutindo
ainda, a meia voz. Pouco antes do jantar uma visita apareceu à porta: um menestrel, um
caminhante cuja lira, suspensa do ombro, lhe garantia o bom acolhimento e o alojamento onde
quer que fosse. Depois de lhe terem oferecido comida, um banho e roupas secas, o menestrel
veio e tomou o lugar destinado aos convidados mais bem-vindos, perto do fogo. Começou a
afinar o seu instrumento, encostando o ouvido às cravelhas de tartaruga e testando o som com
o dedo. Em seguida, sem pedir licença - já nesse tempo um bardo fazia o que entendia -
dedilhou um único e sonante acorde e declamou:
“Cantarei as batalhas e os grandes homens que nelas combateram; Os homens que
permaneceram por dez anos defronte das muralhas de Tróia, erigidas por gigantes;
E os Deuses que derrubaram, por fim, essas muralhas: Apolo, Senhor do Sol, e
Posídon, O que Faz Tremer a Terra.
Cantarei a lenda da vida do poderoso Aquiles, nascido de uma Deusa, tão forte que
arma alguma o poderia destruir. E mesmo a história do seu orgulho e arrogância e aquela
batalha em que ele e o grande Heitor lutaram ao longo de três dias nas planícies, frente às
altas muralhas de Tróia;
O orgulhoso Heitor e o galante Aquiles, os Centauros e as Amazonas, Deuses e
heróis,
Odisseu e Enéias, todos os que combateram e foram mortos nas planícies, diante de
Tróia...”
— Não! — exclamou a velha bruscamente, deixando cair o fuso e levantando-se. —
Não o permitirei! Não quero ouvir esses disparates contados na minha sala!
O menestrel deixou a mão esquerda tombar sobre as cordas, num tanger dissonante; o
seu ar era de desalento e surpresa, mas o tom de voz foi cortês.
— Senhora?
— Digo que não permitirei que essas estúpidas mentiras sejam contadas junto à minha
lareira! — disse ela veementemente.
As crianças soltaram sons de desapontamento; ela silenciou-as com um gesto
imperioso.
— Menestrel, és bem-vindo a tomar a tua refeição e a sentar-te ao pé do meu fogo;
mas não permitirei que enchas os ouvidos das crianças com essas mentiras sem sentido. Isso
não foi, de todo, assim.
— Verdade? — inquiriu o tocador de harpa. — Como o sabes, senhora? Eu canto a
lenda como me foi ensinada pelo meu mestre, tal como é cantada em todos os lugares desde
Creta a Cálcis...
— Pode ser cantada dessa forma desde aqui até a ponta do mundo — disse a velha —,
mas não foi, de todo, assim que aconteceu.
— Como sabes? — perguntou o menestrel.
— Porque estava lá e assisti a tudo — replicou a velha. As crianças murmuraram e
gritaram.
— Nunca nos contaste isso, avó. Conheceste Aquiles, e Heitor, e Príamo, e os heróis
todos?
— Heróis! — disse ela com desdém. — Sim, conheci-os; Heitor era meu irmão.
O menestrel inclinou-se para diante e olhou-a insistentemente.
— Sei agora quem és — disse ele por fim.
Ela assentiu inclinando a cabeça branca.
— Então talvez tu, senhora, devesses contar a história; eu, que sirvo o Deus da
verdade, não mais cantaria mentiras para serem escutadas por todos os homens.
A velha ficou por longo tempo em silêncio. Por fim, disse:
— Não, não consigo viver tudo aquilo de novo.
As crianças lamentaram-se, desapontadas.
— Não tens outra lenda para cantar?
— Muitas — disse o tocador de harpa — mas não queria contar uma história da qual
escarnecesses como de uma mentira. Por que não contas a verdade para que eu possa cantá-la
em outros lugares?
Ela sacudiu energicamente a cabeça.
— A verdade não é uma boa história.
— Não podes ao menos dizer-me quais são os desvios da minha história, para que eu a
possa emendar?
Ela suspirou.
— Houve um tempo em que eu teria tentado — disse — mas nenhum homem quer
acreditar na verdade. Porque a tua história fala de heróis e reis, não de rainhas; e de Deuses,
não de Deusas.
— Não é bem assim — disse o tocador de harpa — pois grande parte da história fala
da bela Helena, raptada por Páris; e de Leda, a mãe de Helena, e sua irmã Clitemnestra,
seduzida pelo grande Zeus, o qual tomou a forma de seu marido, o rei...
— Sabia que não poderias compreender — disse a velha mulher — já que, para
começar, nesta terra a princípio não existiam reis, mas somente rainhas, as filhas das Deusas e
estas escolhiam os seus consortes onde queriam. Mas, depois, os adoradores dos Deuses do
Céu, a tribo dos cavaleiros, os utilizadores do ferro, desceram à nossa terra; e quando as
rainhas os tomaram como consortes, eles intitularam-se reis e exigiram o direito de governar.
E assim os Deuses e Deusas se tornaram rivais; e chegou o tempo em que Tróia foi palco das
suas disputas... — deteve-se abruptamente. — Basta! — disse ela. — O mundo mudou. Vejo
que me julgas uma velha cujo espírito divaga. Este foi sempre o meu destino: falar a verdade
e nunca ser acreditada. Sempre foi assim e sempre assim será. Canta o que quiseres; mas não
zombes da minha verdade junto à minha lareira. Há muitas lendas. Conta-nos a de Medéia,
Senhora de Cálcis, e do tosão dourado que Jasão roubou do seu santuário, se é que o fez.
Ousaria dizer que também para essa lenda existe outra verdade, mas eu não a conheço nem
me interessa saber qual será; há muitos e longos anos que não ponho pé em Cálcis. —
Apanhou o seu fuso e, calmamente, começou a fiar.
O tocador de harpa baixou a cabeça.
— Seja como queres, Cassandra — disse ele. — Todos pensamos que morreras em
Tróia ou, pouco depois, em Micenas.
— Então isso devia provar-te que, pelo menos em certos detalhes, a lenda não diz a
verdade — disse ela, mas em voz baixa.
“Mantém-se a minha sina: falar sempre a verdade e ser apenas julgada louca. Até
hoje, o Senhor do Sol não me perdoou...”

Monday, November 2, 2009

Absoluta

Saturday, October 31, 2009

FHC

01 de novembro de 2009 | N° 16142
ARTIGOS
Para onde vamos?, por Fernando Henrique Cardoso*


A enxurrada de decisões governamentais esdrúxulas, frases presidenciais aparentemente sem sentido e muita propaganda talvez levem as pessoas de bom senso a se perguntarem: afinal, para onde vamos? Coloco o advérbio “talvez” porque alguns estão de tal modo inebriados com “o maior espetáculo da terra”, de riqueza fácil que beneficia a poucos, que tenho dúvidas. Parece mais confortável fazer de conta que tudo vai bem e esquecer as transgressões cotidianas, o discricionarismo das decisões, o atropelo, se não da lei, dos bons costumes. Tornou-se habitual dizer que o governo Lula deu continuidade ao que de bom foi feito pelo governo anterior e ainda por cima melhorou muita coisa. Então, por que e para que questionar os pequenos desvios de conduta ou pequenos arranhões na lei?

Só que cada pequena transgressão, cada desvio, vai se acumulando até desfigurar o original. Como dizia o famoso príncipe tresloucado, nesta loucura há método. Método que provavelmente não advenha do nosso Príncipe, apenas vítima, quem sabe, de apoteose verbal. Mas tudo o que o cerca possui um DNA que, mesmo sem conspiração alguma, pode levar o país, devagarinho, quase sem que se perceba, a moldar-se a um estilo de política e a uma forma de relacionamento entre Estado, economia e sociedade, que pouco têm a ver com nossos ideais democráticos.

É possível escolher ao acaso os exemplos de “pequenos assassinatos”. Por que fazer o Congresso engolir, sem tempo para respirar, uma mudança na legislação do petróleo mal explicada, mal ajambrada? Mudança que nem sequer pode ser apresentada como uma bandeira “nacionalista”, pois se o sistema atual, de concessões, fosse “entreguista” deveria ter sido banido, e não foi. Apenas se juntou a ele o sistema de partilha, sujeito a três ou quatro instâncias político-burocráticas para dificultar a vida dos empresários e cevar os facilitadores de negócios na máquina pública. Por que anunciar quem venceu a concorrência para a compra de aviões militares se o processo de seleção não terminou? Por que tanto ruído e tanta ingerência governamental em uma companhia (a Vale) que, se não é totalmente privada, possui capital misto regido pelo estatuto das empresas privadas? Por que antecipar a campanha eleitoral e, sem qualquer pudor, passear pelo Brasil às custas do Tesouro (tirando dinheiro do seu, do meu, do nosso bolso...) exibindo uma candidata claudicante? Por que, na política externa, esquecer-se de que no Irã há forças democráticas, muçulmanas inclusive, que lutam contra Ahmadinejad e fazer mesuras a quem não se preocupa com a paz ou os direitos humanos?

Pouco a pouco, por trás do que podem parecer gestos isolados e nem tão graves assim, o DNA do “autoritarismo popular” vai minando o espírito da democracia constitucional. Essa supõe regras, informação, participação, representação e deliberação consciente. Na contramão disso tudo, vamos regressando a formas políticas do tempo do autoritarismo militar, quando os “projetos de impacto” (alguns dos quais viraram “esqueletos”, quer dizer obras que deixaram penduradas no Tesouro dívidas impagáveis) animavam as empreiteiras e inflavam os corações dos ilusos: “Brasil, ame-o ou deixe-o”. Em pauta, temos a transnordestina, o trem-bala, a Norte-Sul, a transposição do São Francisco e as centenas de pequenas obras do PAC, que, boas algumas, outras nem tanto, jorram aos borbotões no orçamento e minguam pela falta de competência operacional ou por desvios barrados pelo TCU. Não importa: no alarido da publicidade, é como se o povo já fruísse os benefícios: “Minha casa, minha vida”; biodiesel de mamona, redenção da agricultura familiar; etanol para o mundo e, na voragem de novos slogans, pré-sal para todos.

Diferentemente do que ocorria com o autoritarismo militar, o atual não põe ninguém na cadeia. Mas da própria boca presidencial saem impropérios para matar moralmente empresários, políticos, jornalistas ou quem quer que seja que ouse discordar do estilo “Brasil potência”. Até mesmo a apologia da bomba atômica como instrumento para que cheguemos ao Conselho de Segurança da ONU – contra a letra expressa da Constituição – vez por outra é defendida por altos funcionários, sem que se pergunte à cidadania qual o melhor rumo para o Brasil. Até porque o presidente já declarou que em matéria de objetivos estratégicos (como a compra dos caças) ele resolve sozinho. Pena que tivesse se esquecido de acrescentar “l’État c’est moi”. Mas não esqueceu de dar as razões que o levaram a tal decisão estratégica: viu que havia piratas na Somália e, portanto, precisamos de aviões de caça para defender “nosso pré-sal”. Está bem, tudo muito lógico.

Pode ser grave, mas, dirão os realistas, o tempo passa e o que fica são os resultados. Entre estes, contudo, há alguns preocupantes. Se há lógica nos despautérios, ela é uma só: a do poder sem limites. Poder presidencial com aplausos do povo, como em toda boa situação autoritária, e poder burocrático-corporativo, sem graça alguma para o povo. Este último tem método. Estado e sindicatos, Estado e movimentos sociais estão cada vez mais fundidos nos altos-fornos do Tesouro. Os partidos estão desmoralizados. Foi no “dedaço” que Lula escolheu a candidata do PT à sucessão, como faziam os presidentes mexicanos nos tempos do predomínio do PRI. Devastados os partidos, se Dilma ganhar as eleições, sobrará um subperonismo (o lulismo) contagiando os dóceis fragmentos partidários, uma burocracia sindical aninhada no Estado e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão. Estes são “estrelas novas”. Surgiram no firmamento, mudaram de trajetória e nossos vorazes mas ingênuos capitalistas recebem deles o abraço da morte. Com uma ajudinha do BNDES, então, tudo fica perfeito: temos a aliança entre o Estado, os sindicatos, os fundos de pensão e os felizardos de grandes empresas que a eles se associam.

Ora dirão (já que falei de estrelas), os fundos de pensão constituem a mola da economia moderna. É certo. Só que os nossos pertencem a funcionários de empresas públicas. Ora, nessas, o PT, que já dominava a representação dos empregados, domina agora a dos empregadores (governo). Com isso, os fundos se tornaram instrumentos de poder político, não propriamente de um partido, mas do segmento sindical-corporativo que o domina. No Brasil, os fundos de pensão não são apenas acionistas – com a liberdade de vender e comprar em bolsas – mas gestores: participam dos blocos de controle ou dos conselhos de empresas privadas ou “privatizadas”. Partidos fracos, sindicatos fortes, fundos de pensão convergindo com os interesses de um partido no governo e para eles atraindo sócios privados privilegiados, eis o bloco sobre o qual o subperonismo lulista se sustentará no futuro, se ganhar as eleições. Comecei com para onde vamos? Termino dizendo que é mais do que tempo de dar um basta ao continuísmo antes que seja tarde.

*Ex-presidente da República

Friday, October 30, 2009

S.

Houve um tempo, tempo tão distante que não faz mais parte da lembrança da humanidade, em que nasceu um menino risonho de cabelos loiros encaracolados. Nasceu prematuro, e a Sorte quis que sobrevivesse. Digo a sorte pois não havia recurso médico em caso de complicações da prematuridade. Era um lugar muito quente, às margens de um rio caudaloso, onde não soprava o vento.

A mãe do menino não gostava daquele lugar e logo mudou-se para outro, ainda quente, mas que à noite refrescava. O menino ali cresceu e seus cabelos foram ficando lisos e morenos. Su pele era clara, mas não pálida. Seus olhos castanhos claros entregavam duas coisas a sua mãe (à época uma bruxa poderosa): seu filho era capaz de ver o mundo dos espíritos e de conhecer os penamentos e a alma das pessoas. Naquela noite chorou muito por S. - este era seu nome. Sabia no sofrimento que esses “dons” implicariam no futuro.

S. atingiu a adolescência e, após 9 gerações de bruxas comandadas por mulheres, a mãe recebeu a ordem de suas antepassadas de que S deveria ser iniciado e sucedê-la no comando do clã. Mais uma vez, assustada, chorou. Mas um antepassado em quem confiava – seu falecido pai, ele próprio bruxo -tranquilizou-a em sonho. Disse-lhe: a S foi dada o fardo da precognição, porém também a sabedoria de julgar.

S. viveu sua vida como curandeiro, ofício em que destacava-se pelas vantagens de seus secretos conhecimentos.

Faleceu e foi chamado para Emissário da Morte. Recentemente – entendam, falamos de séculos/milênios – foi descoberto por um demônio menor chamado M. - e foi chamado pelo Chefe para trabalhar no RH. É nosso Analista de Acordos para Almas Imortais, tem uma sala modesta no final do corredor, no mesmo andar que a minha, e todo mês saímos para beber. Prometeu-me um presente de Dia das Bruxas e disse: este presente violará diversas regras daqui e lá de Cima, mas danem-se. Eles quem me ensinaram a burlar as regras. Pena que só abro amanhã à noite. Meia-noite. 31/10/2009 A.D.

Resolveu “antecipar” - palavras dele – a entrega, pois ano que vem partirá. Dia 01/01. Preciso solicitar nova nomeação.

Alan Turing again

"from: aturing@mail.above.net.aa
to alexandre.lucas@rh.underworld.net.zz
date Sat, Oct 31, 2009 at 12:10 AM
subject Internet and Human Rights
mailed-by mail.above.net.aa
signed-by above.net.aa

Prezado Senhor Alexandre Lucas,

Quem lhe escreve é o antecessor em interesse pela informática Alan Turing. Recentemente saí de longa depressão desde meu suicídio com uma maçã por mim envenenada com cianureto em 1954. A história você já conhece e amigos aqui de cima disseram-me que inclusive repercutiu recentemente após o pedido de desculpas do Governo Inglês, na figura do Primeiro Ministro Gordon Brown. Confesso que esse tardio reconhecimento foi o que me tirou da depressão e auto-comiseração.

Na última semana até criei coragem e li seus posts técnicos sobre softwares e hardwares. Agradou-me o interesse mútuo, mas não é isso que me traz a estas linhas, e sim a falsa sensação de segurança e aceitação social que venho observando na comunidade GLBT.

Verdade que na maioria do mundo civilizado os tempos não são mais tão difíceis e de absurda crueldade e desumanidade como em 1954, quando deram a mim, um herói da 2a Grande Guerra, duas "opções" por ser homossexual: cadeia ou castração química. Os efeitos nefastos sobre meu corpo da 2a me levaram a considerar e levar a cabo o suicídio. Fui perdoado e por isto escrevo daqui de cima.

Tive tempo de estudar e observar o desenrolar dos tempos nestes anos todos de relativa reclusão aqui no além-morte. Posso dizer e peço que observem que a relativa aceitação, retirada do código internacional de doenças (ainda não atingido pelas comunidades trans e intersexo), redução dos direitos fundamentais negados e repressão das várias formas de preconceito e estresses familiar e profissional.

Peço atenção: não baixem a guarda. A sensação de segurança é ilusória. Para tomar como exemplo o Brasil, só ocorre em menos de meia dúzia de grandes centros urbanos, e restrita a "guetos" - palavra adequada embora com aspectos pejorativos - e é descaradamente negada às classes baixas e na maioria do país grassa o preconceito aberto, com apoio da maioria da população. Poucos corajosos vão abrindo caminho, como eu - no meu caso involuntariamente - sob grande custo pessoal.

Sabemos que seu Chefe, como o Meu, são simpatizantes. Ambos acima desses humanos atrasos mentais. Isso é que me leva a confiar que um dia a igualdade de direitos será atingida. Peço que me informe, agora que descobri a militância, em que posso ajudar.

Atenciosamente,
Alan Turing

(tradução gentil do inglês britânico para o português contemporâneo pelos anjos (agora caídos) que estiveram a instigar o povo da extinta Babel bíblica).

Minha resposta foi sucinta:
Caro Alan,

Inicialmente peço que perdoe chamá-lo pelo 1° nome, mas achei Mr. Turing por demais sisudo. Apenas lhe digo: fique tranqüilo. Veremos, não nego, retrocessos, mas a Roda da Vida gira sempre adiante, ao final. Consultei nosso jurista, Conselheiro Pavi, e ele compartilha esta opinião, também pela posição dos Poderosos, embora o Papa Palpatine pregue o contrário.

Humberto Eco já dizia que somos anões no ombro de gigantes. Tenha o orgulho de que não viveu nem sofreu em vão. Sua mensagem ficará para sempre aqui registrada.

Conselho pessoal: peça autorização ao controle de trânsito e compareça a algumas de nossas festas. Traga Harvey Milk com você. Sentirão que nada como a troca de felicidades.

Um abraço,

Alexandre Lucas.

P.S.: a Tábata já está agendando esteticista e médicos para reverterem suas seqüelas. O pessoal aí de cima é muito conservador e valoriza chagas. Águas passadas não movem moinhos.

"É difícil aprisionar os que têm asas" - Caio Fernando Abreu

“Desde muito novos temos uma estranha sensação nas costas. Custam-nos muito movimentos como o rastejar, o enterrar ou o arrastar. Olham-nos com desconfiança. Não entendemos bem o que nos falta e porque teimam em dizer que nos falta alguma coisa. Quando nos nascem as pequenas asas, existe uma tendência quase natural para as esconder, não vá o diabo tecê-las e apontarem-nos também o dedo por termos algo de extraordinário. Evitamos grandes exposições, somos discretos e naturalmente calados. Há medo e quase só em intimidade é que vamos abrindo as nossas pequenas asas. Os primeiros vôos fazem-se em casa onde, normalmente, nos impulsionam e exemplificam os vôos. Depressa nos habituamos às alturas, a ver as diferentes perspectivas da terra, das pessoas e objetos. Gostamos de dias de sol e de vento na cara. Em terra falta-nos algo, sentimo-nos presos, respiramos com dificuldade. Temos várias designações porque as pessoas gostam muito de rotular, etiquetar e tipificar sobretudo o que diz respeito aos outros. Uns chamam-nos cabeças no ar, alienados, almas do outro mundo e até loucos. Outros, porque não sabem bem quem são, procuram um modelo e dizem-nos heróis quando na verdade aquilo que temos é mesmo e nada mais do que asas. Vamos ganhando altura. As asas já não recolhem, em terra tropeçamos e derrubamos tudo. No céu, planamos e fazemos piruetas, somos ágeis. O acasalamento é difícil, não há muitas pessoas com asas, os rituais são arriscados e temos um pouso muito incerto. Mesmo em bando somos considerados um pouco solitários e muito independentes. Os anos vão passando, vamos envelhecendo, as asas ficam mais queimadas pelo sol, porém persistimos, insistimos no vôo. Fazemos menos milhas, temos necessidade de ir mais vezes à terra. Então aí reinventamos novas formas de voar e, às vezes, ficamos apenas parados a observar o céu e pensar que já conhecemos uma considerável parte do mundo.”

Margarida Fortuna, Palavras de Sabão

Sunday, October 18, 2009

M.

A cobertura triplex de M. em Londres definia estilo. Era exatamente como um apartamento de um demônio deveria ser: enorme, paredes pintadas à perfeição, mobiliado com móveis de datas já não lembradas, e com aquela “cara” de ninguém-vive-aqui que só é realmente possível não se vivendo ali.

M. não vivia ali.

Era somente seu refúgio quando estava no plano material. As suítes tinham camas kingsize sempre feitas, com lençóis egípcios; a geladeira de aço escovado repleta de comidas finas que nunca estragavam. Com cuidado, olhei por trás e percebi que sequer estava plugada na tomada.

Na espaçosa sala de estar observei um televisor enorme, um sofá de couro branco, hometheater com HD-DVD e BluRay, um telefone sem fio (também sem estar ligado nem à rede elétrica e tampouco à telefônica, mas com duas linhas funcionantes – uma na cidade, e outra para o RH do Inferno. Também havia um sistema de som Bang&Olufsen, com designe tão exótico que só tinha o botão de liga-desliga e o controle de volume. Só não vi os alto-falantes; ele os esquecera. M. Explicou-me que não faziam diferença. A reprodução era perfeita como numa sala de orquestra.

Havia um computador que jamais havia sido usado, mas M. mandava atualizá-lo a cada mês, porque achava que o tipo de humano que ele tentava parecer teria um computador destes. Parecia uma BMW com uma tela gigante. Os manuais estavam intocados em seus saquinhos transparentes. (NOTA: * Junto com a garantia-padrão que dizia que se a máquina 1) não funcionasse, 2) não fizesse o que os anúncios diziam, 3) eletrocutasse a vizinhança imediata, 4) ou falhasse inteiramente em estar dentro da caixa caríssima quando você a abrisse, isso expressa, absoluta e implicitamente não seria em momento algum culpa ou responsabilidade do fabricante - o comprador deveria se considerar afortunado ao se permitir dar seu dinheiro ao fabricante. “Qualquer tentativa de tratar o que havia acabado de ser pago como propriedade da pessoa que o adquiriu resultaria na atenção de advogados sérios com maletas ameaçadoras”. Óbvio que era um Mac. Não obstante, M. admirou as garantias oferecidas pela indústria, e na verdade até me enviara uma caixa de presente, para Baixo, e outra para o departamento que fazia os acordos de Almas Imortais dentro do RH do Inferno, com uma pequena nota em papiro amarelado anexada dizendo apenas: "Aprendam, caras”.)

Em seu apartamento M. dedicava alguma atenção pessoal apenas às suas plantas. Enormes, verdes e gloriosas, com folhas saudáveis e lustrosas.

Neste dia ensinou-me que era porque, uma vez por semana, ele percorria o apartamento com um borrifador de água de plástico transparente, borrifando somente as folhas e falando com as plantas.

Leu sobre falar com plantas no começo dos 1970 A.D., e achara uma excelente ideia. Embora conversar talvez não definisse corretamente o que M. fazia.

O que ele fazia era instilar o medo de Deus nelas.

Ou, o medo de M..

Desta forma” - gabou-se - “a cada duas semanas pego uma planta que esteja crescendo muito devagar, ou com alguma praga ou ficando com folhas queimadas, ou simplesmente que não me agrade como as outras. Levo-a até a estufa no cume do apartamento onde as mantenho todas e digo em alta voz: Digam adeus à sua amiga. Ela não resistiu...”.

Então saía do apartamento com a planta ofensora, e voltaria uma hora ou mais depois com o vaso de flores vazio, que deixaria em algum lugar bem destacado.

As demais plantas mostravam-se verdes e lindas, as mais belas de Londres. Casualmente também eram as mais aterrorizadas.

Só observei uma única decoração de parede: um desenho emoldurado — o esboço original da Mona Lisa de Leonardo da Vinci. M. o havia comprado do artista numa tarde quente em Florença, e pressentiu que era superior à pintura final. (Nota: Leonardo também achava. "Consegui pegar direito o maldito sorriso dela nos esboços", contou a M., bebericando champagne gelado no sol do meio-dia, "mas isso se dispersou quando o pintei. O marido dela tinha algumas coisas a dizer quando entreguei o retrato, mas, como eu disse, Signor dei Giocondo, tirando o senhor, quem é que vai ver? De qualquer maneira... explique esse negócio do helicóptero outra vez, sim?").

O quarto de M. era um quarto razoavelmente pequeno – mostra de seu desdém pelo cômodo -, uma cozinha com a referida geladeira e demais eletrodomésticos. Todos aparentando recém chegados.

Adentrei o escritório, na verdade um saguão e um banheiro: cada aposento eternamente limpo e perfeito.

Amigo de longa data, permitiu-se confessar-me que havia passado um tempo desconfortável em cada um desses aposentos, durante a longa espera pelo Fim do mundo, que sabemos, não chegou.

Pediu-me desculpas para telefonar a agentes no Departamento de Castigos Eternos, para tentar conseguir notícias de uma encomenda, mas seu contato havia acabado de sair, e a recepcionista burrinha parecia incapaz de compreender que ele estava disposto a falar com qualquer um dos outros.

O Sr. Pavi também saiu, coração. Ele subiu para São Paulo esta manhã. Numa missão.

Falo com qualquer um — havia explicado M..

Vou dizer isso ao Sr. Pavi quando ele voltar. Agora, se o senhor não se importa, é uma das minhas manhãs de compras com a Tátaba do RH, e não posso deixá-la aqui ou ele morre. E às duas tenho o Sr. Alexandre Lucas, o Sr. Tony Goes e a jovem Libanesa vindo para uma sessão espírita. Tenho que limpar o lugar e fazer um monte de coisas antes. Mas darei o seu recado ao Sr. Pavi.

M. desistiu. Chamou-me para conhecer seu acervo multimídia. Tentara colocar seus CDs em ordem alfabética, mas desistira quando descobriu que eles já estavam em ordem alfabética, assim como sua estante, e sua coleção de música erudita (ele tinha muito orgulho de sua coleção). Levara eras para reuni-la. Era música da alma de verdade. Mozart não tinha nada a ver com ela.

Acabamos nos sentando no sofá de couro branco. Fez um gesto para a televisão.

Estão chegando notícias — disse - as notícias são que, bom, ninguém parece saber o que está acontecendo, mas parecem, ahn, indicar um aumento de tensões internacionais .

"Isto parece ser devido pelo menos em parte à grande quantidade de eventos incomuns que têm ocorrido nos últimos dias. "Na costa de Samoa..." M.?

Sim — retrucou-me M..

-QUE DIABOS ESTÁ ACONTECENDO, M.? O QUE EXATAMENTE VOCÊ TEM FEITO?

Como assim? — perguntou M., embora já soubesse.

-O NOSSO MESTRE ESTÁ INSATISFEITO COM AS METAS.

Ah — disse M..

-ISSO É TUDO QUE VOCÊ CONSEGUE DIZER, M.? NOSSAS TROPAS ESTÃO FORMADAS, AS QUATRO BESTAS COMEÇARAM A CAVALGAR — MAS PARA ONDE ESTÃO CAVALGANDO? ALGUMA COISA DEU ERRADO, M.. E É SUA RESPONSABILIDADE. E, BEM PROVAVELMENTE, SUA CULPA. ACREDITAMOS QUE VOCÊ TENHA UMA EXPLICAÇÃO PERFEITAMENTE RAZOÁVEL PARA ISTO TUDO...

Ah, sim — concordou M. prontamente. — Perfeitamente razoável.

-... PORQUE VOCÊ VAI TER SUA CHANCE DE EXPLICAR TUDO PARA NÓS. VOCÊ VAI TER TODO O TEMPO QUE EXISTE PARA EXPLICAR. E NÓS VAMOS ESCUTAR COM GRANDE INTERESSE TUDO O QUE VOCÊ TENHA A DIZER. E SUA CONVERSA, E AS CIRCUNSTÂNCIAS QUE A ACOMPANHAM, FORNECERÃO UMA FONTE DE ENTRETENIMENTO E PRAZER PARA TODOS DO INFERNO, M.. PORQUE NÃO IMPORTA O QUÃO DEVASTADOS PELO TORMENTO, NÃO IMPORTA QUE AGONIAS OS MAIS INFERIORES DOS MALDITOS ESTEJAM SOFRENDO, M., VOCÊ SOFRERÁ MAIS...

Com um gesto, M. desligou o som.

A tela verde-acinzentada continuava enunciando; o silêncio se formou em palavras.

-NEM PENSE EM TENTAR ESCAPAR DE NÓS, M.. NÃO HÁ ESCAPATÓRIA. FIQUE ONDE ESTÁ. VOCÊ SERÁ... COLETADO... PELA CORREGEDORIA!

M. foi até a janela à prova de ruídos – como se houvesse ruiídos a 65 andares de altura - e olhou distraidamente. Notou um carro negro descendo lentamente a rua em sua direção. Tinha forma suficiente de carro para enganar o observador distraído. M., que estava observando com muita atenção, reparou que não só as rodas não estavam rodando, como também não estavam sequer tocando o pavimento. Ele se aproximava; M. supôs que os passageiros do carro (nenhum deles estaria dirigindo; nenhum deles sabia como) estavam olhando os números das casas.

M. tinha pouco tempo. Foi até a cozinha e tirou um balde de plástico debaixo da pia. Então voltou ao hall.

As Autoridades Infernais haviam cessado sua comunicação. M. virou a televisão para a parede, por via das dúvidas.

Foi até a Mona Lisa.

Retirando o quadro da parede, revelou um cofre. Não era um cofre de parede; ele havia sido comprado de uma empresa especializada em atendimento à indústria nuclear.

Destrancou-o, revelando uma porta interna com uma trava de combinação. Girou a combinação (4-0-0-4 era o código, fácil de lembrar, o ano em que ele havia caído naquele estúpido, maravilhoso planeta, quando ainda era novo e reluzente).

Dentro havia uma garrafa térmica, duas luvas grossas de PVC, do tipo que cobria os braços inteiros de uma pessoa, e tenazes.

M. parou. Olhou nervoso o frasco.

(Ouviu um barulho no andar de baixo. Era a porta da frente...).

Calçou as luvas e apanhou desajeitado o frasco, as tenazes e o balde e se dirigiu para seu escritório, caminhando como um homem que carregava uma garrafa térmica cheia de alguma coisa que poderia provocar, se ele a deixasse cair ou mesmo pensasse nisso, o tipo de explosão que leva velhos de barbas grisalhas a dizerem coisas :"E aqui onde existe esta cratera hoje, existia a cidade de “Wah-Shing-Ton”", em filmes ainda não filmados.

No escritório, abriu a porta com o ombro e lentamente colocou as coisas no chão. Balde... tenazes... e finalmente, deliberadamente, o frasco e transferiu seu conteúdo para o borrifador das plantas.

Uma gota de suor escorreu na testa de M.,até sua orelha. Limpou-a.

Cuidadosa e deliberadamente, atarraxou a tampa do borrifador... com cuidado... MUITO CUIDADO...

Eu seguia observando.

(Uma pancada surda nas escadas abaixo, e um grito abafado. Devia ser a velha senhora no andar de baixo.)

Ele não podia se dar ao luxo de correr.

Segurou o borrifador e assegurou-se estar bem fechado, tomando cuidado para não derramar a menor gota. Um movimento em falso seria o bastante.

Pronto.

Então abriu a porta do escritório cerca de dez centímetros e colocou o balde em cima – no qual havia despejado o restante do líquido.

Pegou o borrifador de plantas e sentou-se atrás de sua mesa.

M....? — chamou uma voz gutural.

Ele está ali — sibilou outra voz. — Posso sentir o nojento.

Dois demônios, mas não podiam ver-me, graças a um dispositivo com o qual certa vez o Chefe me presenteou.

Agora, como M. seria o primeiro a protestar, a maioria dos demônios não eram tão maus assim. No grande jogo cósmico eles sentiam que ocupavam a mesma posição de fiscais de renda: faziam um trabalho que não era popular, mas essencial para a operação global da coisa toda - já explicado em posts anteriores deste blogue. Bem sabíamos, alguns anjos também não eram baluartes da virtude; M. havia conhecido um ou dois que, na hora de atacar justamente os infiéis, atacavam com mais força do que o estritamente necessário. No Plano do Ser, todo mundo tinha um trabalho a fazer, e o fazia.

E por outro lado, você tinha gente como aqueles dois demônios, que tinham tanto prazer em fazer o desagradável que não seria difícil confundi-los com humanos.

M. recostou-se em sua cadeira executiva. Forçou-se a relaxar e falhou de modo evidente.

Aqui, pessoal — chamou.

Queremos dar uma palavrinha com você — disse o mais alto (num tom de voz que pretendia implicar que "palavrinha" era sinônimo de "eternidade horrivelmente dolorosa"), e o demônio mais baixo empurrou a porta do escritório.

O balde rodopiou e caiu direitinho na cabeça do mais alto.

Derrame um pedaço de sódio anidro na água. Observe-o se incendiar e queimar e girar loucamente, cuspindo faíscas. Foi igualzinho, só que bem mais feio.

O demônio descascou, incendiou-se e tremeluziu. Uma fumaça marrom oleosa começou a emanar de seu corpo, e ele gritou e gritou e gritou. Era como se sua forma se amassasse, se dobrasse sobre si mesma, e o que sobrou ficou brilhando no círculo queimado e escurecido de tapete, parecendo um punhado de plástico queimado.

Oi — disse M. para o baixinho, que vinha andando atrás e, infelizmente não tinha recebido sequer um pingo.

Existem certas coisas que são impensáveis: coisas que nem mesmo os demônios acreditam que outros demônios se atreveriam a fazer.

... água benta. Seu filho da puta. — Seu completo filho da puta. Ele nunca sequer fizera nada a você.

Ainda não — corrigiu M., que se sentia um pouco mais confortável, sorrindo, agora que as chances estavam mais favoráveis. Mais, mas não completamente equilibradas, nem de longe. O demônio baixinho era um Duque do Inferno. M. não era sequer um conselheiro local.

Seu destino será sussurrado por mães em lugares escuros para apavorar seus filhos — disse o Duque, e então sentiu que a linguagem do Inferno não estava surtindo o efeito esperado. — Você vai virar poeira de estrela, companheiro — acrescentou.

M. ergueu o borrifador de plantas de plástico verde e o sacudiu ameaçador.

Vá embora — disse. Ouvi o telefone tocar lá embaixo. Quatro vezes, e então a secretária eletrônica atendeu. Imaginei quem seria.

Você não me mete medo — disse o Duque.

Sabe o que é isto? — perguntou M.. — Isto é o borrifador de água mais barato do supermercado, e surpreendentemente o mais eficiente borrifador de plantas do mundo. Ele pode espirrar uma fina camada de água no ar. Será que eu preciso lhe dizer o que está aqui dentro? Pode transformar você naquilo — apontou para a sujeira no tapete. — Agora caia fora.

Você está blefando — disse o Duque.

Talvez esteja — disse M., num tom de voz que esperava que deixasse bem claro que blefar era a última coisa em sua mente. — E talvez não. Está se sentindo com sorte?

O Duque um gesto, e o bulbo plástico desapareceu como se nunca houvesse existido.

Sim — disse O Duque. E sorriu. Seus dentes eram afiados demais e sua língua dançava entre eles, bífida. — E você?

M. não disse nada. O Plano A havia funcionado. O Plano B, falhado. Tudo dependia do Plano C, e só havia um problema: ele não tinha certeza de que eu colaboraria.

Então — sibilou o Duque — hora de ir, M..

Acho que tem algo que você devia saber — disse M., tentando ganhar tempo.

O que é? — sorriu o Duque.

Então o telefone na mesa de M. tocou. Ele pegou o fone.

Não se mexa. Tem uma coisa muito importante que você devia saber, e eu estou falando sério. Alô?

Ngh — disse M.. Então disse: — Não. Tem um velho amigo aqui.

M. desligou na cara dele. M. ficou tentando adivinhar o que ele queria.

E de repente o Plano C estava lá, em sua cabeça. Não colocou o fone de volta no gancho. Em vez disso ele disse:

Ok, Duque. Você passou no teste. Está pronto para entrar no time dos grandes.

Você ficou louco?

Não. Não está entendendo? Isto foi um teste. Os Senhores do Inferno precisavam saber se você era digno de confiança antes de lhe darmos o comando da Legiões das Pestes, na Guerra adiante.

M., você está mentindo ou você está louco, ou provavelmente as duas coisas — disse o duque, mas com evidente incerteza. Só por um momento, ele havia alimentado a possibilidade; de que ele estava onde M. o havia colocado. Não seria impossível que o Inferno o estivesse testando. E que M. fosse mais do que parecia. O Duque era paranóico, o que era simplesmente uma reação sensata e bem-ajustada a se viver no Inferno, onde realmente estava todo mundo a fim de te pegar. E onde pode-se achar uma unha em um brigadeiro.

Nisto desliguei o dispositivo e o Duque deu um pulo para trás, surpreso. Como não havia sentido a minha presença? Mas me conhecia..

Tudo bem, Duque . Nada estava acertado ainda, mas acredite: vindo de mim faremos ad referendum do Conselho das Trevas? Tenho certeza de que eles o convencerão.

O número que M. havia discado deu um clique e começou a tocar.

Tchau, babaca — disse ao Duque.

E desapareceu.

Numa ínfima fração de segundo, desapareci também, deixando ao Duque o número da secretária da Tábata, para os arranjos finais no pequeno papel no chão em tinta preta.

Eu acabara de pagar a M.

Pelo ensino do cultivo de plantas.

O Duque rosnou, fez o bilhete vir à sua mão com um gesto, e voltou ao carro que não era carro.

Wednesday, October 14, 2009

Sally's Pigeons


Sally's Pigeons
Artist: Cyndi Lauper
When I was eight I had a friend With a pirate smile Make believe and play pretend We were innocent and wild Hopped a fence and slammed the gate Running down my alleyway In time to watch Sally's pigeons fly We loved to watch them dive and soar Circle in the sky Free as a bird from three to four And never knowing why Neighbors pulled their wash back in Put away my Barbie and Ken Look out overhead While Sally's pigeons fly I had a fool's confidence That the world had no boundaries But instincts and common sense Come in different quantities My heart began to Skip to the beat Of the boy next door She had her eye across the street On someone shy and tall We lived our dreams And challenged fate In tears she told me she was late And Sally let his pigeons out to fly... On the dresser sits a frame With a photograph Two little girls in ponytails Some twenty one years back She left one night with just a nod Was lost from some back alley job I close my eyes and Sally's pigeons fly She never saw those birds again And me, I can't remember when A pirate smile hasn't made me cry I close my eyes And Sally's pigeons fly...

Saturday, October 10, 2009

Arte Sacra

Todas as imagens ampliam-se quando se clica com o botão direito do mouse sobre elas.


-Postal com a obra que mais apreciei: Nossa Senhora das Dores:
-Verso do cartão postal:

-Ingresso:
-A sinalização é precária (placa marrom):
-Idem:
-lindo ipê-roxo no páteo interono:


-muro visto por fora:

Recomendo a visita =D

Cretone


O cretone (cretonne em francês), é sinônimo de bramante. Tecido encorpado, de algodão e/ou linho ou outras mesclas, com cânhamo entrelaçado, muito utilizado, especialmente no passado na confecção de colchas, cortinas e tapetes.
O nome seria homenagem ao francês Paul Creton, grande empresário têxtil da antiga Normandia.
Considerado tecido nobre, aconchegante e macio, foi muito exportado pelos países da Europa Ocidental.

Psicografia (b)

Em resposta:

From: zzalexandre.lucas@rh.underworld.net.zz
To:jmspjr@underworld.net.
Date: A.D. 2009/10/11
Subject: Evo
Estimado Barão do Rio Branco,

Dê como certas as providências. O Chefe em pessoas, apesar de não poder adiantar os fatos, por acordo diplomático com o Andar de Cima, prometeu um Natal que será verdadeiro dia das bruxas para esses andinos. Já enviou Belzebu para acertar algumas coisas.
Notícias serão enviadas de pronto.
Atenciosamente,

Alexandre Lucas
RH do Inferno

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